terça-feira, 15 de outubro de 2013

quem trabalha perdeu a sensação de recompensa

«Tenho lido muito sobre os portugueses que, cada vez mais, emigram. Numa das últimas reportagens sobre portugueses que viviam em Londres constatava-se que, quase todos, faziam trabalhos em nada relacionados com a sua área de formação e muitas vezes, coisas que, em Portugal considerariam “menores” e não fariam. 
Quando tinha 17 anos, fui vender enciclopédias porta a porta. Os meus pais não acharam muita piada, mas apoiaram o meu primeiro emprego. Depois disso, sempre que procurei empregos em part-time, a única possibilidade que surgia, eram os call centers, lugares cheios de estudantes universitários e licenciados. 
Os portugueses que foram à procura de mais oportunidades e de um mundo maior em Londres trabalham em lojas, restaurantes, cafés e desempenham outras funções em horários compatíveis com estudos, castings e outros empregos. 
Em Portugal, ter um emprego antes de terminar a licenciatura é visto como uma coisa estranha, feita apenas por absoluta necessidade. Com exceção dos call centers, não existem oportunidades pensadas para quem continua a estudar. 
Mas as dificuldades não estão apenas do lado de quem oferece trabalho, mas também de quem o procura. Esta capacidade de nos adaptarmos a qualquer emprego, de procurar trabalho sem preconceitos de formação, existe apenas quando saímos do país. Esta sensação de que qualquer emprego vale a pena em nome da tentativa de lutar por uma oportunidade. 
Seria fácil dizer que os portugueses não gostam de trabalhar, facto que os emigrantes por esse mundo fora desmentiriam facilmente. Seria fácil dizer que os licenciados não querem empregos sem ser na sua área. Eu acho que o problema está na palavra “oportunidade”. Quem trabalha em Portugal nunca tem a sensação de que os esforços, um dia, significarão uma oportunidade.
Quem trabalha em Portugal sabe que lavar casas de banho significa lavar casas de banho para sempre. Quem dá emprego não quer um estudante universitário para ajudar a servir às mesas à hora de almoço, quer alguém que queira ficar a servir às mesas, querem alguém que “não venha um dia a querer uma coisa melhor”
É fácil fazer todos os esforços quando lutamos por um sonho, por uma oportunidade, por alguma coisa melhor. É tão difícil fazer trabalhos “menores” num país em que isso significa nunca sair de coisas pequenasDinheiro Vivo.

Li esta reportagem hoje e fez-me todo o sentido. Nos tempos que correm não há perspetivas de crescimento. As empresas não pensam a longo prazo. Não dão hipótese para uma pessoa crescer na carreira. Já não há aquela máxima vangloriada do administrador que começou por ser estafeta. Hoje em dia, estafeta és, estafeta serás. Deixam-se estar sossegados, abrigados, à espera que a tempestade passe. Uma cambada de gente que só joga pelo seguro. Grrrrr, esta inércia mata-me!

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